Novíssimo Movimento Estudantil? Ou Rótulos Novos para Vinhos Velhos?

Novíssimo Movimento Estudantil? Ou Rótulos Novos para Vinhos Velhos?

18 de outubro 2009
Secretário Político da UJC (Rio de Janeiro)Renato Martins
Fonte: http://ujcriodejaneiro.blogspot.com

No dia 7 de outubro, última quarta-feira, o jornal O Globo deu imenso destaque a uma reunião de 12 estudantes secundaristas, entre 15 e 17 anos, fundadores de uma nova organização estudantil, a NOVENova Organização Voluntária Estudantil. A matéria intitulada o “novíssimo movimento estudantil” ocupou a capa do jornal, uma página inteira na seção “O País” e mereceu uma extensa reportagem sobre o tema.

Alguém, com um espírito crítico mais afiado, poderia se indagar porque uma reunião estudantil de apenas 12 pessoas, todas elas jovens, brancas, filhos da classe média, mereceu tanta atenção do jornal.

Já ocorreram outras reuniões de estudantes muito mais cheias, politicamente mais significativas, aliás, acontecem a todo tempo nas escolas e nas universidades. O que fizeram estes jovens para merecerem dedicado destaque? Será que há algo de novo no movimento? O que há de diferente nesta reunião tão pouco expressiva no que diz respeito ao número de militantes, porém bastante significativa se contarmos o patrimônio e as contas bancárias dos pais dos mesmos?

A resposta não tarda a aparecer. O Globo, um periódico reconhecido nacionalmente por inclinar as suas posições políticas às causas das classes hegemônicas deste país, que, não é demais lembrar, reiteradamente apoiou os militares golpistas (1964-1985) e suas posições sempre conservadoras, assim como as privatizações da ventania neoliberal (de 1990 para cá), parece que encontrou um movimento estudantil que é a sua cara. Como sabemos, desde a “redemocratização” as organizações estudantis da direita oficial, juventudes ligadas ao PSDB, DEM, PTB, dentre outras, que se alinham politicamente a este grupo empresarial, não têm tido espaço no movimento estudantil.

A motivação aparente da fundação da organização se deve ao adiamento das provas do ENEM (Exame Nacional do Ensino Médio). No entanto, ao longo deste texto se mostrarão que as razões são mais profundas do que as apresentadas.

A jornalista Maiá Menezes informa que a organização surgiu em colégios particulares da zona sul do Rio de Janeiro. Os alunos entrevistados recusam o rótulo de se tratar de um movimento estudantil elitista, contudo, uma rápida pesquisa por telefone expõe seu o caráter “popular”. As mensalidades (1º ano do ensino médio) nas escolas citadas na matéria são as seguintes: o Colégio Notre Dame, em Ipanema, custa R$ 914,80; no Colégio Teresiano, na Gávea, R$ 1.200,00; a Escola Parque, também na Gávea, R$ 1.356,00. Infelizmente, o Colégio Santo Inácio, localizado em Botafogo, e o PH — unidade Ipanema, não atenderam as chamadas. Em um país, cujo salário-mínimo é de R$ 465,00, chega a ser ridículo negar o perfil conservador do NOVE, sem contar o fato de ser orientado a partir das classes mais altas da cidade. Pesquisa do Dieese (2008) revela que 95% dos trabalhadores brasileiros recebem até dois salários-mínimos.

As organizações de direita, em muitos casos, se envergonham ao se assumir como direita. Ao contrário das esquerdas, que sempre se reivindicam como tal. Mesmo os que negam a existência da oposição direita/esquerda, em geral, filiam-se à direita no espectro político. Em outros termos, para os que estão na hegemonia é mais fácil não reconhecer a existência “do outro”. Recorda-se que, na França, algumas eleições atrás, um partido ultra-conservador lançou o slogan eleitoral “Direita sem constrangimento”. Talvez sirva como sugestão ao NOVE, assumir as posições conservadoras e deixar claro suas posturas à direita, sem melindre.

Curiosa é maneira de articulação dos militantes e simpatizantes do movimento. As convocações e deliberações se dão através da internet, em sítios eletrônicos de relacionamento como o Orkut, MSN, Facebook, dentre outros. Esse fato atesta, mais uma vez, a sua natureza burguesa, já que menos de um terço dos brasileiros possuem acesso à internet, segundo o Ibope.

Outra questão apontada seria o suposto caráter apartidário do movimento, como se isso fosse um sinal de bondade, neutralidade, ingenuidade e boa intenção. “Somos apartidários”, brada um dos entrevistados, “não queremos envolvimento com nenhum tipo de jogo político”. Sabe bem o estudante que está envolvido até o pescoço com o tal jogo político. Não ser filiado a partidos não significa, de maneira alguma, que [não] se possa tomar partido, posturas políticas ou posicionamentos. Tampouco é verdade que somente os partidos façam política, todos nós fazemos política; as empresas, as instituições governamentais, as ONGs, as emprensas, o jornal Globo, as TVs, os movimentos sociais, etc. Mesmo os não partidários podem seguir a linha política de determinados partidos, consciente ou inconscientemente.

Nos dias de hoje, esta instituição chamada “partido” é uma das mais mal vistas pela sociedade. Não é por acaso, é uma opção política depreciar esta instituição. A propaganda anti-partidária tem sido bastante comum na imprensa burguesa. Um dos mais célebres neoliberais, o economista Milton Friedman, no seu livro “Capitalismo e Liberdade”, defendia que se deveria “diminuir o número de questões decididas por meios políticos” e deixar ao mercado capitalista conduzir as sociedades. Assim, com partidos fracos, temos Estados igualmente fracos e, portanto, um terreno livre para as práticas neoliberais.

O NOVE, recém foi criado, e já possui um culpado para o estado das coisas no movimento estudantil. Segundo Maiá Menezes, “os jovens rejeitam lideranças e fazem cara feia para políticos e são unânimes em desqualificar a UNE [União Nacional dos Estudantes] e a UBES [União Brasileira dos
Estudantes Secundaristas]“. É certo que a UNE/UBES possuem uma grande parcela de culpa no atual cenário, porém não é só isso. A incompetência, o imobilismo, o burocratismo, seu posicionamento acrítico, como mera correia de transmissão do governo Lula, assim como o favorecimento aos acordos de cúpula e a disputa por cargos nos aparelhos governamentais em detrimento da luta e mobilização pela base, constituem as principais razões para tornar a UNE/UBES um grande agente na desmobilização no movimento estudantil nacional. Entretanto, há um vasto rol de questões que apontam para a situação no M.E., todas elas tratadas nos nossos documentos.

Neste sentido, não podemos nos furtar a mencionar o papel nefasto promovido pela UJS [União da Juventude Socialista], juventude ligada ao PCdoB [Partido Comunista do Brasil], que há mais de duas décadas dirigem estas organizações através de mecanismos corruptos, como fraudes, roubo de urnas, falsificação de votos, cooptação de lideranças, etc. Tais organizações já abandonaram o marxismo-leninismo há muito tempo e nos envergonham por ainda usar foice e o martelo, só faltam aos mesmos reconhecerem isso.

Não rejeitamos a UNE/UBES, pelo contrário reivindicamos ambas; contudo, somente um amplo esforço de reconstrução dessas organizações pela base, nas salas de aula, nos pátios das escolas, nos campus das universidades, poderá recolocar a UNE/UBES no seu caminho histórico de lutas e conquistas políticas, como no episódio da “Campanha o Petróleo é Nosso”, na resistência à ditadura militar, nos debates pelas eleições diretas, nos movimentos que derrubou Collor da presidência.

Não nos surpreende a exaltação dada por este periódico ao movimento, que nada possui de novo. Poderia ter sido qualquer outro instrumento da grande imprensa, Jornal do Brasil, jornal O Dia, TV Bandeirantes, TV Globo, Folha de S. Paulo, Estadão, etc. O revolucionário e intelectual italiano Antonio Gramsci, em 1916, no texto “Os jornais e os Operários”, já alertava sobre o poder de influência política-ideológica da imprensa burguesa. O Globo e o NOVE apenas fazem a parte que lhes cabem no atual estágio da luta de classe. Nós, da UJC (União da Juventude Comunista), faremos a nossa.

Até a vitória

Renato Martins
Secretário Político da UJC (Rio de Janeiro)

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