Helenira, a Guerrilheira de Assis, tombou há 30 anos

Fórum Assisense em 03 de abril de 2.003
De Marcio Amêndola de Oliveira

No dia 29 de setembro de 1972, a guerrilheira 'Fátima', ou 'Nega', como era conhecida, foi asssasinada pelos soldados da ditadura militar que dominava o País, e que durou de 1964 a 1984. Eram os chamados anos de chumbo no Brasil, e a repressão aos chamados movimentos de esquerda, particularmente do meio estudantil, era feroz e de uma crueldade indescritíveis.

'Nega', ou Helenira Rezende de Souza Nazareth era então uma jovem de 28 anos de idade.

Líder estudantil, Helenira chegou a ocupar a Vice-Presidência da UNE (União Nacional de Estudantes), que já teve líderes como os atuais José Direceu (Ministro Chefe da casa Civil de Lula), e José Serra (ex-senador). Foi justamente como vice-presidente da UNE que Helenira começou a ter problemas com o regime militar. Presa por duas vezes em 1968, a vida normal para ela não era mais possível num país dominado pela repressão, pela tortura e pelo medo.

Foi então que Helenira decidiu, a exemplo de centenas de outros jovens de sua época, entrar para a clandestinidade. Mudou de nome e ingressou na chamada 'Guerrilha do Araguaia', uma romântica e fracassada tentativa dos grupos de esquerda da época de organizarem uma resistência armada à ditadura, através da guerra de guerrilhas, no sul do Pará.

De Assis para a História
Helenira era filha de um ilustre morador de Assis, nos anos 40/60, Adalberto de Assis Nazareth. Médico, Negro, Comunista e Espírita, Dr. Adalberto tinha todos os 'quesitos' para sofrer perseguições e desprezo de uma comunidade provinciana e conservadora da época.

Mas não se importava com isto. Dr. Adalberto era um tipo de 'médico de família', muito antes dos programas atuais que tentam imitar esta prática. Ele recebia o povo em seu humilde consultório, e quase não ganhava dinheiro, já que se penalizava com a condição dos mais humildes. Há relatos de que Dr. Adalberto, muitas vezes, recebia seus honorários por meio de leitões, frangos, espigas de milho, mandioca e outras coisas, 'trocadas' por suas consultas médicas. Ao morrer, Dr. Nazareth recebeu, como homenagem, o nome de uma Rua (uma das travessas da rua do Cemitério).

Cresci ouvindo essas histórias, e percebi porque uma das filhas de Dr. Adalberto adquiriu o gosto pela política e pela luta popular por melhores dias para este País tão cheio de miséria e contrastes.

Vida abreviada
Helenira nasceu em Cerqueira César, na região de Avaré em 1944, e mudou-se para Assis com seu pai, passando a infância e a juventude em nossa cidade. Foi aprovada para o curso de Letras da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da USP (Universidade de São Paulo), que nos anos 60 funcionava na Rua Maria Antonia, no bairro da Consolação, na Capital. Durante o curso de Letras, Helenira tornou-se rapidamente uma destacada líder estudantil, chegando à Vice-Presidência da UNE (União Nacional de Estudantes). Com o golpe militar de 1968, a exemplo de milhares de outros jovens estudantes da época, passou a ser vigiada pela ditadura, chegando a ser presa duas vezes, uma das quais em 1968, no famoso Congresso da UNE, na cidade de Ibiuna (SP).

Helenira entrou então para a Guerrilha do Araguaia. Em setembro de 1972 foi emboscada e presa. Segundo a ex-presa política Elza de Lima Monnerat, que sobreviveu à ditadura, Helenira, ao ser emboscada pelos militares, resistiu a bala, matando um soldado e ferindo outro. Metralhada nas pernas, ficou gravemente ferida. Isto não impediu que fosse torturada barbaramente. Como não delatou seus companheiros escondidos na floresta, 'Nega' acabou sendo morta a golpes de baioneta, no dia 29 de setembro de 1972.

Helenira Rezende de Souza Nazareth entrou para a História da resistência à ditadura militar. Seu nome consta em vários livros, entre os quais "Brasil Nunca Mais" (1985), coordenado pela Arquidiocese de São Paulo e pelo Grupo Tortura Nunca Mais; e "Dos Filhos desde Solo", escrito por Nilmário Miranda e Carlos Tibúrcio (1999, Editora Boitempo, Páginas 179 e 233).

Márcio Amêndola de Oliveira é Jornalista e 'filho' de Assis-SP.

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